> Conforto Térmico e a Estética de Fachadas de Vidro

Conforto Térmico e a Estética de Fachadas de Vidro

Economia de energia não é novidade para os vidreiros.

A arquitetura de grandes edifícios vem evoluindo há décadas no sentido de produzir vastas fachadas envidraçadas.

Esta tendência se iniciou em países de zonas temperadas, onde a insolação é bem inferior que a de países tropicais, movida pelo interesse em se aproveitar ao máximo o sol e economizar com aquecimento e iluminação. Estes fatores acabaram por se associar à beleza e modernidade que grandes fachadas envidraçadas conferem aos projetos arquitetônicos.

Como construções assim foram muito bem-vindas, edifícios com as características acima começaram a ser construídos em regiões mais ensolaradas em zonas tropicais.

Como resultado, os modernos edifícios envidraçados passaram a apresentar sobreaquecimento, tornando-se desconfortáveis, além de exigirem grandes consumos de energia com aparelhos de ar condicionado. Isto porque as fachadas de vidro funcionaram produzindo o efeito estufa: a radiação solar atravessa o vidro aquecendo as paredes e móveis do interior do edifício, que por sua vez aqueciam o ar. O envidraçamento impedia a saída deste ar, deixando o ambiente excessivamente quente.

Para que os arquitetos continuassem a projetar grandes áreas envidraçadas, os fabricantes começaram a estudar formas de conferir aos vidros novas propriedades e evitar inconvenientes.

A primeira solução foi colorir o vidro, que desta maneira impediria a passagem de parte da radiação solar, porém permanecendo parcialmente transparente, deixando a iluminação entrar.

Surgiram assim os vidros de cores cinza ou fumê, bronze e verde. Estes vidros são coloridos através da adição de alguns componentes em sua composição que, dissolvidos na massa do vidro, interagem com a radiação solar, absorvendo parte dela e fazendo com que a vidraça funcione como um filtro de luz.

Mas os vidros coloridos possuem limitações. Se forem muito escuros bloqueiam grande parte da radiação solar, tornando o ambiente interno pouco iluminado durante o dia. Nesse caso, embora possa parecer menor a necessidade de ar condicionado, será necessário utilizar mais iluminação artificial, que por sua vez aumenta o consumo de energia e o aquecimento do ambiente, consequentemente exigindo maior utilização de ar condicionado.

Outro inconveniente é que os vidros coloridos se aquecem, por absorverem parte da energia solar. Parte do calor absorvido é perdido para o ambiente externo, mas parte contribui para o aquecimento do lado interno.

Para compreendermos como evoluíram os estudos nesse campo, precisamos entender como a radiação solar chega ao nosso planeta.

A luz é composta por ondas eletromagnéticas, assim como as ondas de rádio, as que permitem falarmos no telefone celular, tirar radiografias e aquecer fornos de micro-ondas.

O que diferencia as ondas eletromagnéticas em cada um desses casos são seus comprimentos de onda.

A radiação do sol tem um amplo espectro de comprimentos de ondas. Uma parte deste espectro corresponde à porção que chamamos de luz visível, ou seja, a dos comprimentos de ondas que podemos enxergar.

E não é de se estranhar que ela esteja dentro do espectro de radiação solar. Nossos antepassados habitam há muito tempo esse planeta e se adaptaram a enxergar a parte mais intensa da radiação que chega aqui. https://pt.wikipedia.org/wiki/Radia%C3%A7%C3%A3o_solar

Porém, além da luz visível, o sol ainda emite uma faixa de radiação ultravioleta e outra de infravermelho.

Estas duas faixas não conseguimos enxergar, mas elas têm grande efeito em nossas vidas.

A radiação ultravioleta é a que permite que o nosso organismo metabolize a vitamina D, mas também pode provocar câncer de pele e é a que nos obriga a utilizar filtro solar.

A faixa do infravermelho é responsável por boa parte do calor que sentimos quando expostos ao sol.

Em termos de energia que chega a nós pela radiação solar, ela está dividida na seguinte proporção:

Visível: 47%
Ultravioleta: 2%
Infravermelho: 51%

Os vidreiros prosseguiram com as pesquisas, e uma nova família de produtos foi desenvolvida, os chamados vidros refletivos. Estes possuem a característica de refletir uma fração da radiação solar incidente, deixando passar só o necessário para iluminação. Esta propriedade é obtida pela aplicação de um tratamento superficial que pode ser dado tanto em vidros incolores como nos coloridos. O vidro tratado passa a funcionar como um espelho que não reflete toda a radiação, permitindo que uma parcela dela entre no ambiente.

Neste caso, boa parte da radiação é refletida de volta e mesmo se for colorido o vidro não se aquece tanto, mas os arquitetos passaram a ter que conviver com fachadas fortemente espelhadas pois a luz visível é refletida junto com a fração infravermelha.

A partir disso, os vidreiros desenvolveram vidros que permitem a passagem da luz visível, mas refletem somente as radiações ultravioleta e infravermelha. Eles são chamados vidros de baixa emissividade ou “low E”.

Desta maneira, a vidraça bloqueia mais da metade da energia da luz solar, mas grande parte do espectro visível ainda pode passar, possibilitando a observação do exterior e a iluminação natural.

Visualmente um vidro de baixa emissividade tem o mesmo aspecto de um vidro tradicional, pois ele age somente sobre os comprimentos de onda aos quais somos cegos.

Isto é conseguido com tratamentos de deposição de componentes especiais em camadas extremamente finas na superfície do vidro.

Estas camadas, além de impedir a passagem das radiações indesejáveis, podem gerar cores, conferindo diferentes tonalidades à fachada dos edifícios.

Além disso, se desejado, os vidros também podem apresentar aspecto espelhado.

Ainda mais, essas camadas podem refletir parte da luz visível controlando desta maneira a quantidade de luz que se deseja permitir passar para o interior.

Para situações em que a passagem de energia não se faz por radiação, mas por condução, como, por exemplo, nos países de clima frio, em que se aquece o ambiente interno e se deseja ter janelas que permitam a entrada de luz, sem o calor sair, foram desenvolvidos envidraçamentos duplos.

Estes duplos envidraçamentos são constituídos por duas lâminas de vidro formando uma câmara de gás entre eles e a esquadria. O gás aplicado é um mal condutor de calor e dificulta a perda de energia através da janela.

Se os vidros aplicados nesse tipo de envidraçamento forem os de baixa emissividade, a vidraça garantirá bom desempenho energético tanto no inverno como no verão podendo até mesmo serem mais isolantes que uma parede de tijolo convencional.

Não são apenas em edifícios que estes tipos de vidros são aplicados. Eles são utilizados também nos refrigeradores de bares e supermercados, que têm as portas transparentes para que os clientes possam enxergar os produtos em seu interior.

Esses vidros impedem boa parte da entrada de calor do meio ambiente no refrigerador, contribuindo com a economia de energia.
Do ponto de vista prático, a redução do gasto com energia em aquecimento interno em países frios ou energia elétrica em ar condicionado em países tropicais podem atingir até 66% e, no nosso caso, conta ainda com benefício de redução de impostos mediante certificação tipo Procel (Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica).

Por razões de segurança, os vidros aplicados em fachadas de edifícios são laminados, isto é, constituídos por duas chapas de vidro formando um sanduíche com um plástico no interior. Esse plástico, extremamente resistente, tem a função de segurar os cacos em caso de fratura, impedindo que pessoas se firam ou que o vão da janela fique aberto até a reposição da peça.

Este plástico pode ser incolor e invisível, mas também pode assumir diversas colorações que, em conjunto com as camadas aplicadas na superfície, abrem um leque enorme de possibilidades aos arquitetos.

Enfim, através do conhecimento do material com que trabalhamos, da pesquisa e do desenvolvimento de novos processos e técnicas, novas características e funcionalidades são adicionadas ao vidro, já tão versátil e útil.

Mauro Akerman
Abril 2020